segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

A ATEMPORALIDADE DE JOSÉ SARNEY

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Vestido preto no armário, sofá branco na sala de estar e José Sarney no poder têm algo em comum: funcionam.
Que não se espere deles nenhuma surpresa. No mais das vezes seu desempenho é mediano. Mas como seria difícil imaginar o mundo sem eles…
É por isso que Sarney pode se dar ao luxo de repetir que não é candidato à sucessão de Renan Calheiros na presidência do Senado. Porque pertence à categoria das coisas básicas.
O PMDB tem meia dúzia de aspirantes à vaga de Renan. Por ora, um deles continua sendo mais aspirante do que os outros – Garibaldi Alves (RN).
O excesso de aspirantes significa que o partido não tem um candidato natural. À sua época, Renan foi um candidato natural.
Por favor não confundam candidato natural com vestido preto ou sofá branco.
Qualquer mudança na conjuntura altera a condição de naturalidade de um candidato. Vestido preto e sofá branco independem da conjuntura. Estão acima e a salvo dela. São ítens atemporais.
Sarney tornou-se atemporal depois de quase seis décadas de política. Foi deputado federal pela primeira vez no remotíssimo ano de 1955. Desde então nunca mais esteve fora do poder. Pode ter estado em desacordo com ele, mas excluído dele, jamais.
Presidentes da República foram depostos (Getúlio Vargas, João Goulart e Fernando Collor). O caráter do regime político mudou mais de uma vez (presidencialista, parlamentarista no início dos anos 60 e novamente presidencialista).
A democracia naufragou em 1964 e cedeu lugar a uma ditadura militar que durou 21 anos. De início branda, quase envergonhada, ela tirou a máscara e se assumiu como tal em dezembro de 1968. Parte dos anos 70 foi a mais sombria da história política recente do país.
O fracasso do modelo econômico bancado pelos generais deixou a ditadura exangue. Começou então a abertura política lenta e gradual.
A democracia acabou por se restabelecer com a eleição indireta para presidente da República de Tancredo Neves, avô de Aécio Neves, atual governador de Minas Gerais.
O vestido preto, o sofá branco e Sarney atravessaram incólumes todos esses turbulentos anos.
De presidente do partido que apoiava a ditadura, Sarney se fez vice de Tancredo, o primeiro civil que sucedeu a cinco generais presidentes. Com a morte de Tancredo, substituiu-o em definitivo.
Por mais de 15 anos, Lula quis ver Sarney pelas costas – de preferência aposentado e cuidando dos netos no Maranhão. De 2002 para cá não abre mão de tê-lo ao seu lado.
Foi Sarney que mudou? Não. Foi Lula que aprendeu a cantar”Metamorfose Ambulante”, de Raul Seixas.
Sarney é e será o que sempre foi – assim como o vestido preto e o sofá branco.
Não é candidato a presidente do Senado porque simplesmente não precisa ser.  O Senado, se quiser, que se candidate a tê-lo como presidente.

Por Ricardo Noblat

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